10.23.2007

NÃO É DE SÚBITO QUE OLHO PARA DENTRO

Olho que olha para dentro
Somente terra a dentro é possível pensar
Não acontece o mesmo com a superfície...
Ou nas alturas...
Minha malícia está profundamente enraizada
É aqui que lido com ela
É tarde demais para ver o sol...
Os cães estão enlouquecidos...
Roçam os focinhos no chão para livrar-se dos carrapatos...
Aqui não os tenho...
Embora eu os ouça
E sinta algo por eles
No que se refere ao assassinato que me colocou nesta posição
A apresentação do corpo bastou para apagar os ressentimentos
Mesmo após a carnificina ainda resiste a sensação de algum outro crime oculto
Imagino-me na superfície... mas insisto nos olhos vendados
Desvio o meu olho exausto pois tentar focalizá-lo é fisicamente desgastante
Mesmo nesta condição há bolhas de sangue borbulhando em meu cérebro...
Sinto arranhões produzidos por ilusões passageiras
Por nossas tentativas de algum desvio
Há manchas em minha carne mas não são exatamente cicatrizes
Minhas cicatrizes são produzidas pelo meu próprio espelho
De meu ato de respirar surgirá sempre o inesperado.
Não. Não me esqueça. Há tantos objetos que aceitam remendos.
Mesmo a faca...
O sangue pode ser lavado
Decerto escorrerá pelo ralo
Longe de meu corpo
Endurecemos tanto as nossas expressões
Paremos...
Vamos jantar e depois dormir
O branco que hoje possuo é o mais violento de todos
As palavras que tento pronunciar não fecham feridas
Há esse veneno da curiosidade
Corrosivo
Desintegrando o fígado
Mas não preciso de fígados ruins
A respiração penosa está sumindo
E o que virá agora me lançará ao fundo
Se a respiração tomou controle é porque aprendeu a não existir
A balança está revertida mediante a único golpe
Inalei gás venenoso antes de ser esfaqueado
E o vapor que cegou meus olhos mostra o rosto de um sujeito estrategicamente mergulhado na obscuridade
A partir daqui tudo me é eternidade...
Aqui posso ver meu olho pelo lado de dentro
Enxergo com precisão a inflamação de meus rins
E o que dá origem a meus sonhos
Minha ausência e meu amor são irmãos gêmeos
Ambos doem
Ambos são sublimes
Estou em uma janela onde a casa sonha ser mundo
Onde minha alegria tem cabimento
Onde não há a inveja dos anjos
Não é de súbito
Sempre há algo para se inventar
Entrem... um a um
Deixo poeirar os objetos da sala
Quero destruir meus objetos provisórios
Ainda assim não desejo o definitivo
Quero fechar os olhos e afiar uma lâmina de alegria
Quero submergir minha alma...
Quero desraciocinar
Gastei noites demais esperando os dias...
O regresso está ganho
O barco irá me buscar...
Esqueci o meu nome...
Há quem olhe a fera e pense na jaula
Quero desentortar a alma...
Aborver o silêncio quando ele chega
Quero fazer barulho
Cor em minha penumbra...
Sombra acompanhada...
Não é de súbito...