10.25.2006

moscas

não percebemos a mosca que invadia nossos orgãos sexuais
transeunte noturna de cio intelectual e nenhuma gratidão
todos os dias roubou nosso sangue
até o dia em que pudesse procriar
repare nos alicerces do edificio em que ela sempre viveu...
não há alicerces muito menos edifícios....
nem o aluguel foi pago pela sua existência
tudo o que construimos foi consumido por uma voraz parasita
nossos espiritos tao protegidos foram apunhalados por um zumbido insistente
"Eu havia me preparado!..."
quando disse tal coisa a mosca não perdeu tempo
deste a ela algo que sozinha nunca teria
e amassou aquela flor no vão de seus dedos
com uma delicadeza aterrorizante
sombras já nos buscaram outras vezes
mas essa se precipitou como uma cabeça que cai decepada
não há nada mais ridiculo que o prazer de um ser sem vontade propria
a vitima do tedio é capaz de vender sua alma todos os dias
o tempo que gera lucro e o tempo pra viver são de naturezas diferentes...
moscas tem que correr para ter lucro... sua existência é pequena
busca a terrivel felicidade que oculta a vida... que nega a vida
minha falta de interesse pelas moscas é a única maneira de bater na imbecilidade
a natureza não aceita a beleza, o mal, os imbecis...
estirpa...
meu coração é uma pedra na forma mais pura de um diamante
chegamos a um entendimento e isso me trás idéias de assassinato
o que vejo são esqueletos cuja carne pertence aos dentes da mosca
caimos na armadilha
como um cabrito em sacrificio
que continua se debatendo por muito tempo depois que a cabeça cai
é quando as moscas atacam...



a luz que parece ver é um negativo de um escuridão sem fim
talvez nossa natureza fosse plena em maldade
nossos desejos mais sutis e delicados não se destinam a uma ferida fisica mas a uma ferida unica em nossas almas
ainda é preciso segurar um pouco mais o vidro quebrado em nossas mãos
o que aguardo com esperança é aquilo que temo
não possuo nenhum desprezo e nenhuma resistência
no mais tudo isso me parece uma lata enferrujada coberta pelo mato...
um céu sem expectativa carregado de uma hipocrisia açucarada
existem frestas no vão da parede e nelas te visito
nossa musica esse zumbido monotono de moscas
por mais que sejam dedilhadas... adormecem
por fim nossa carne foi retalhada
e nosso espírito está de partida
nossos dedos... dignos
relacionam-se com o vazio
sem súplicas
sem humildades

10.18.2006

clarezas traidas


quantos navios vistes partir no porto com o mesmo buque nas mãos?
quanto à minha dor terás minha conduta...
em relação a tua liberdade e tua sensação de passaro livre... digo que a liberdade também se assemelha a morte...
a vitória da traição é trair a clareza....
que já não tens
deixaste de olhar-se nua....
sei que amas da mesma forma com que admira o brilho de uma lâmina afiada
quando a noite vem...
quando não mentes para o espelho...
(ilustração: Lucian Freud)

10.16.2006

estopas não congeladas

delicadezas sim...
nenhum amor congelado...
as maldades são equilibrantes
plenas...
para essa estopa nenhum ácido...

10.14.2006

estopas secas

nenhuma umidade
nem mesmo os pés tropeçaram juntos
nenhuma palavra e um clima tão perfeito...
e o som de tua lingua mais uma vez dizendo: "Pára!"
(...)
Dores de casas sem janelas
platéia cheia para eu vazio
delicadezas pontiagudas
a liberdade de estopas e a infelicidade por estopim
uma implacável sondagem de minhas profundezas
e nós preenchidos de uma santidade vulgar
é natural que haja sombras
é natural que essa liberdade não seja a essência do amor
que seja um inimigo
minha negação é uma concessão
nosso laço é o poder que tenho de não poder ser ferido
um bálsamo para minha maldade
aos poucos consigo distinguir o ruído das formigas
enquanto me dedico ao esporte de caçar pensamentos
Há em mim um buraco na pele onde goteja meu sangue
porque não detivemos o tempo quando a garrafa estava cheia?
chamo de destino nossa incapacidade de parar o tempo
divido meu corpo em fragmentos iguais
Acho que estás com sono
e tens todo o direito de estar
a noite terminou....
é natural que em minha dor...
me limpe com estopas secas

para os que te comem

para palavras que doem
mesmo quando velhas
para os reis que envelhecem
pois não conseguem ficar nus por muito mais tempo
para minhas mãos não pregadas na cruz
para seres que perderam asas
para flores sem significados
para mural sem recados
para os suicidas que acreditaram
para estes... meu coração cortado em postas

para os que te chutam
para os que mentem
para palavras com lâmina na ponta
para os amigos faquires que lhe miram as costas
para os que te comem
para os que servem banquetes com suas dores
a estes... meu estômago

para os cegos
para os que não olham
os que pisam
os perdidos que te consomem
meu olho

para os ruins
os de maldade plena
os que ferem pela honra
os que acreditam
a estes... minha língua

para os que comem sua mulher ou sua mãe ou sua alma
para os arrebentam a cara
para os fracos
os parasitas
os heróis
os intolerantes
os "compartilhadores"
a recíproca e a guilhotina
(...)

10.07.2006

de nossas noites...

de nossas noites
fígados foram roubados
nossos corpos divididos
e entregues ao açoite
pela lâmina cortado
e por urubus consumidos
de nossas bocas... veneno
de nosso sexo... pau pequeno
de nossas mãos... batemos
de nossos odores... fedemos
de nossos amores... perdemos
de nossos sonhos
cortamos asas
de nossa construção caiu a casa
e o caso
e o vaso...
de nossos dias... um sol ressecado
um pescoço estrangulado
e muitas aves marias pra não haver culpados
ainda que espetado por alfinetes
entrego-me
com peitos cheios de leite
para que possarmos voar e perdoar... cortes com estiletes
de nossa despedida
uma alma ressentida
com dores e falsos amores
a coisa mal resolvida
e estranhas flores
de nossos objetos... quebrados
de nossos cães sem ração
de nossos sorrisos cortados
de nosso amor
traição
de nossa traição nenhum ressentimento
de vc... nenhum esquecimento
de nós dois outro momento...
e vento... e lento...
e de nosso destino
o inescapável...

te carrego assim como pancada em meu peito....
meninos homens que não possuem perdão...
cheiro eternizado...
seu cigarro e nossa carne podre...
irmãos como nãos os tenho em vida....
nossa alma entregue
ao corte...




na foto Arthur Netto e Cleiton Pereira - FRATELO

10.03.2006

do ultimo jantar

aqui estamos transparentes como copo dágua
jantando nossa solidão
garfo e faca sobre a mesa
e um único prato branco sem nenhuma exclamação...
não há vinhos para embebedar
nem sais para curar
azias... e louça quebrada no chão
aqui estamos
ausentes do nosso tempero
palitando ilusões
de meu banquete sem desesperos
nem dores passadas no pão
aqui estamos
engolindo nossa saliva
as verdades quero cruas e as dores "bem passadas"
degustemos a carne dolorida e brindemos os corpos no chão
do chute em meu estômago
não tive indigestão...

10.02.2006

estopas

lhe tenho a lealdade de compartilhar tristezas....
lhe ofereço chinelos para descansar os pés
meu silêncio
e meu peito para andar em cima quando não houver mais chinelos
minhas mãos e as suas são vigorosamente esfregadas com sabonete....
não me sinto sozinho quando vc vem...
suas demoras demoram como amoras....
que tenho que entregar...

dos seus dentes

dos seus dentes
32 maiores que sua alma... uma fileira de dentes brancos e tensos... expostos pela sua sujeira... e que deve reluzir como um consutório dentário, e cheirar metal, água e anti-séptico, engolidos pela boca afundada em um sono imóvel... sem nenhuma expectativa... a não ser cuspir...